Transição energética e política tributária no agronegócio

Maria Cristina Kroetz
Clima e agronegócio.
A transição energética e a agenda climática têm impacto direto no agronegócio brasileiro. Entre todos os setores da economia, a produção agrícola é a mais sensível às variações climáticas, o que reforça a importância de conhecer, mensurar e estimar a relação entre clima e cada cultura, a fim de mitigar riscos ambientais, reduzir perdas e assegurar maior produtividade no campo.
Um relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM), publicado em junho de 2024, aponta uma probabilidade de 80% de que, nos próximos cinco anos, a temperatura média global ultrapasse em ao menos 1,5°C os níveis pré-industriais. Tal cenário indica a provável superação dos limites definidos pelo Acordo de Paris e alerta para a intensificação dos eventos extremos, que já vêm gerando impactos relevantes na produção de alimentos, como leite, ovos e carne. Esse contexto eleva custos de produção e exige capacitação técnica para o enfrentamento dos riscos climáticos.
Iniciativas do Governo Federal.
Ao passo que o governo federal avança com a sua agenda climática, o agronegócio brasileiro mantém-se fundamental para economia do país. Não por outro motivo, os gastos com esse importante segmento da economia englobam diferentes políticas macroeconômicas, combinadas de forma a viabilizar a política agrícola brasileira.
De um lado, os incentivos fiscais ligados ao agronegócio são um dos alicerces da política agrícola brasileira, incluindo, mas não se limitando, a: isenção de ITR em áreas de preservação permanente e reserva legal; deduções fiscais relacionadas a pesquisa e desenvolvimento no setor agropecuário; ou redução da base de cálculo de tributos no pagamento por serviços ambientais.
Outra política pública de suma importância ao agronegócio brasileiro é o Plano Safra, lançado anualmente pelo Governo Federal, o qual disponibiliza recursos financeiros para custeio, investimento e comercialização da produção agropecuária.
Para o biênio 2025/2026, há diversas medidas que conectam a produção agropecuária brasileira com riscos climáticos, metas de redução de emissões de gases de efeito estufa, além do enfoque na regularização cadastral e fundiária dos imóveis rurais. Dentre elas encontra-se o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC) e outros instrumentos de fomento a práticas sustentáveis.
ZARC
O ZARC, desenvolvido pela Embrapa em parceria com o Ministério da Agricultura, é uma ferramenta técnica que orienta sobre as janelas de plantio mais adequadas a cada cultura, região e tipo de solo, com base em faixas de risco climático de 20%, 30% ou 40%. Na prática, porém, tornou-se critério fundamental para a concessão de crédito rural e seguro agrícola.
Produtores que contratam o Proagro ou o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) devem seguir as datas de plantio definidas pelo ZARC. Isso porque, em teoria, o ZARC reduziria os riscos climáticos ao orientar o cultivo em períodos mais seguros. E ainda, desde 2024, o Plano Safra trouxe a exigência do cumprimento das recomendações do ZARC para o acesso ao crédito rural. Até então restrita a contratos de pequeno valor e ao âmbito do Proagro, com o Plano Safra 2025/2026, a obrigatoriedade alcança financiamentos acima desse patamar, inclusive em situações em que não há contratação de seguro.
As práticas adotadas pelo agricultor ao fazer uso do solo também são relevantes, pois o ZarcNM – ZARC Níveis de Manejo institui métodos de classificação das áreas de produção agropecuária em níveis de manejo para enquadramento no ZARC. Por enquanto, o ZarcNM foi inserido em um projeto-piloto do PSR. A medida busca valorizar produtores que adotam boas práticas de manejo, permitindo que tenham acesso a benefícios diretos em políticas públicas como o seguro rural.
Deve-se levar em conta, todavia, que a obediência às diretrizes do ZARC e a adoção de boas práticas de manejo do solo podem representar um desafio adicional a pequenos e médios produtores, que muitas vezes carecem de informações técnicas atualizadas e planejamento detalhado, correndo o risco de exclusão do sistema oficial de apoio ao crédito e seguro rurais, justamente nos cenários em que mais precisariam de proteção.
Plano Safra e Sustentabilidade
O Plano Safra 2025/2026 traz uma estratégia de oferta de crédito mais barato para práticas mais sustentáveis, pretendendo incentivar o equilíbrio ambiental, a redução das emissões e aumentar valor agregado na produção agropecuária brasileira.
Outras iniciativas e benefícios que vêm sendo incluídas no Plano Safra nos últimos anos incluem:
Desconto de 0,5% nas taxas para produtores com CAR validado.
Redução de juros em até 1% para bioinsumos e recuperação de pastagens.
Juros reduzidos para pequenos produtores orgânicos.
Apoio técnico e orientação para práticas ecológicas.
Crédito destinado à restauração da vegetação nativa.
Maior financiamento com juros reduzidos para sistemas agroflorestais.
RenovAgro: ampliação do orçamento para recuperação de pastagens.
Proibição de financiamento em áreas embargadas, terras indígenas e em casos de desmatamento ilegal.
Conclusão
Os incentivos fiscais e a adoção de mecanismos como o ZARC e as novas diretrizes de sustentabilidade do Plano Safra são políticas públicas que objetivam a gestão de risco climático e de transição ecológica, mantendo a relevância do setor agropecuário para a economia nacional. Na prática, entretanto, tais medidas exigem dos produtores maior capacidade de adequação técnica e documental para garantir acesso ao crédito, ao seguro rural, ao crédito rural e a outros benefícios fiscais associados à atividade agropecuária.
Nesse cenário, os incentivos tributários e financeiros voltados a práticas sustentáveis assumem papel estratégico, permitindo que os produtores – em especial os pequenos e médios – tenham condições de adaptação às novas exigências.
Assim, compreender o entrelaçamento entre clima, agronegócio e adequação regulatória é essencial para que produtores, investidores e agentes financeiros construam estratégias sólidas, capazes de aumentar a competitividade do setor.
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