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PROCESSOS DE DESAPROPRIAÇÃO: A MODIFICAÇÃO RADICAL DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO STF

Publicado em 18 Outubro 2023

Os processos de desapropriação – seja direta ou indireta – possuem, muitas vezes em razão da complexidade envolvida, longa tramitação. Não são raros processos dessa natureza que demoram várias décadas até serem solucionados. 
Por essa razão, a evolução jurisprudencial ocorrida mais recentemente, em relação à aplicação de juros compensatórios em casos tais, alcançou muitos desses casos ainda não solucionados, provocando insegurança jurídica por potencialmente causar alterações substanciais nos resultados esperados. 

Em maio de 2018, após quase 17 (dezessete) anos de vigência de liminar proferida pelo próprio STF, confirmando entendimento sumulado sobre o tema, a Corte Suprema decidiu o mérito de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, a ADI n. 2332, manifestando entendimento diametralmente oposto àquele que até então vinha sendo adotado por meio da fixação de teses¹. 

Em linhas gerais, a nova disciplina legal, surgida a partir do novo julgamento, estabelece a limitação dos juros compensatórios a até 6% ao ano e a exigência de comprovação, pelo proprietário, da produtividade da propriedade desapropriada. Também trata de limitar os honorários advocatícios, que deverão ser fixados entre 0,5 e 5% sobre o valor da diferença entre o preço oferecido e a indenização fixada pelo Poder Judiciário.

Mais especificamente sobre os juros compensatórios nas desapropriações, o tema estava pacificado pela edição do enunciado da Súmula 618, STF, ocorrida em 1984, segundo a qual “na desapropriação, direta ou indireta, a taxa de juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano”. 

Ou seja: até então, esses juros eram aplicados em percentual maior e sem a necessidade de comprovação do grau de utilização da terra ou mesmo da perda de renda causada pela desapropriação, conforme entendimento pacificado².

O caso, de fato, revela situação especial: houve decisão proferida em juízo cautelar que permaneceu em vigor por mais de 17 (dezessete) anos, amparada em orientação sumulada e que, a partir da radical mudança de entendimento do STF, em 2018, não foi confirmada.
Havia expectativa de que o STF pudesse modular a decisão no que toca aos juros compensatórios. Existem inúmeras situações já consolidadas no tempo que deixaram de ser contempladas pelo novel entendimento. De fato, são numerosas as ações de desapropriação propostas e outras tantas já julgadas sob a orientação jurisprudencial até então existente. 

A aplicação dessa decisão no estado em que os processos se encontram, por exemplo, tem o potencial de retirar das partes o direito de realizar ampla investigação probatória sobre a rentabilidade do imóvel e do aproveitamento econômico no momento da perda de sua posse. Em muitos casos, será impossível retroagir a marcha processual para reabrir a fase instrutória, de modo a comprovar a perda da renda. 
De outro lado, a decisão do STF, tal como proferida, abre as portas à rediscussão das ações de desapropriação já julgadas, com fundamento no art. 535, §§ 5º, 6º, 7º e 8º, do CPC. 

Finalmente, por força do julgamento da ADI, e antes mesmo de seu trânsito em julgado, a Primeira Seção do STJ acolheu, em parte, a proposta de revisão de teses repetitivas antes firmadas sobre o tema, com o julgamento da Petição n. 12344-DF, a bem de consolidar os entendimentos. Foram editadas três novas teses sobre juros nas ações de desapropriação³.

Não há dúvidas de que se está a tratar de tema relevante e de ampla repercussão jurídica, evidenciando-se valores e garantias individuais. Só o tempo poderá revelar os efeitos da aplicação imediata do entendimento manifestado, no que toca aos processos em curso, sob a perspectiva de princípios caros à Justiça, tais como a segurança jurídica e a efetividade da jurisdição.   


¹ (i) “É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração pela imissão provisória na posse de bem objeto de desapropriação”

(ii) “A base de cálculo dos juros compensatórios em desapropriações corresponde à diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença”; 

(iii) “São constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade”

(iv) “É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios em desapropriações, sendo, contudo, vedada a fixação de um valor nominal máximo de honorários.”

² Súmula 618, STF. Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.

Súmula 69, STJ. Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel.
Súmula 114, STJ. Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigidos monetariamente. 

Súmula 408, STJ. Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória nº 1.577, de 11.06.1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13.09.2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula nº 618 do Supremo Tribunal Federal.

Súmula 102. A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações
expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei.

³ A Súmula 408, STJ e a Tese 283/STJ foram canceladas. As Teses 126/STJ, 280/STJ, 281/STJ282/STJ foram adequadas, além da edição de três teses novas: 

(i) “A discussão acerca da eficácia e efeitos da medida cautelar ou do julgamento de mérito da ADI 2332 não comporta revisão em recurso especial”;

(ii)  “Os juros compensatórios observam o percentual vigente no momento de sua incidência”; e 

(iii) “As Súmulas 12/STJ (Em desapropriação, são cumuláveis juros compensatórios e moratórios), 70/STJ (Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença) e 102/STJ (A incidência dos juros moratórios sobre compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado por lei) somente se aplicam às situações havidas até 12.01.2000, data anterior à vigência da MP 1.997-34”.

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