Skip to main content

Confira as principais alterações trazidas pela Lei n. 14.365/2022

Publicado em 07 Julho 2022

INTRODUÇÃO:

No dia 3 de junho de 2022, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 14.365, que modificou relevantes dispositivos do Estatuto da Advocacia, do Código de Processo Civil e do Código de Processo Penal. 

Assim, de forma sucinta, o presente texto cuidará de analisar as alterações mais relevantes nela introduzidas, bem como abordará alguns dos vetos do atual Presidente da República.

ALTERAÇÕES NO ESTATUTO DA ADVOCACIA 

  • A ampliação do rol de recursos para sustentação oral 

O artigo 7º, § 2º-B1, da nova legislação, na direção do que já admitia a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal2, ampliou o rol de recursos que admitem a sustentação oral.  Assim, restaram asseguradas: (i) a possibilidade de sustentação em agravo regimental; (ii) a possibilidade de sustentação oral em recursos interpostos contra decisão de relator que enfrenta o mérito do recurso; (iii) a possibilidade de sustentação oral em ações de competência originária.

O Presidente da República, entretanto, opôs vetos ao §2º-A3 e ao IX-A4, que regulamentavam, respectivamente, a possibilidade de o advogado requerer a retirada do recurso/ação originária do plenário virtual quando interessado em realizar sustentação oral e a possibilidade de realização de sustentação oral de modo presencial ou telepresencial, durante as sessões de julgamento. Segundo entendeu o Presidente, as previsões contrariariam o interesse público, no que tange à celeridade dos processos judiciais ao avanço das novas modalidades de comunicação (síncronas ou assíncronas)5.

  • A vedação à participação de advogados em colaborações premiadas

O § 6º, inciso I6, da nova legislação vedou a participação de advogados em colaborações premiadas realizadas contra seus clientes – sejam estes atuais ou passados. 

Apesar de desde 1994 (ano da criação do Estatuto do Advogado) ser assegurado aos advogados o direito de não depor contra seus clientes (princípio da preservação do sigilo profissional)7, o legislador pretendeu sepultar eventuais dúvidas e, através do § 6º, inciso I da Lei 14.365, expressamente previu a possibilidade de abertura de processo disciplinar, que poderá culminar em pena em face do advogado que quebrar o seu dever de sigilo profissional.

  • A fixação de honorários advocatícios 

A fim de pacificar tema bastante controverso, qual seja, os critérios de fixação de honorários advocatícios, a Lei 14.365/22 alterou a redação do §2º, artigo 22, do Estatuto da Advocacia8, para reforçar a necessidade de obediência estrita das regras do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015, em consonância com o entendimento do STJ (honorários deverão serão fixados entre 10% e 20% do valor da condenação ou do proveito econômico).

Apesar de parecer singela, a mudança trazida pela Lei 14.365/22 fortalece o direito ao justo recebimento dos honorários advocatícios e representa importante conquista para a advocacia.

  • O bloqueio universal do patrimônio do cliente

O artigo 24-A do Estatuo da OAB9, introduzido pela Lei nº. 14.365/2022, dispõe que em casos de bloqueio universal do patrimônio do cliente, por decisão judicial, é garantia do advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens constritos. O escopo desta disposição é a garantia do pagamento dos honorários advocatícios ao profissional do direito que atua em defesa do titular dos bens bloqueados, assim como o reembolso de gastos que o advogado teve com a defesa do seu cliente. 

De acordo com o §1º, do referido artigo, o requerimento de desbloqueio de bens deverá ser realizado em autos apartados - que possuirão trâmite sigiloso - e deve estar instruído com o contrato de serviços advocatícios. Salienta-se que a ordem de desbloqueio de bens, disposta no artigo 835, do Código de Processo Civil, deverá ser observada - conforme prescreve o § 2º, do novo artigo em análise. 

Ademais, o §3º estabelece que em caso de desbloqueio de valores em dinheiro - em conta ou em espécie - o montante será transferido para a conta do advogado, ou do escritório de advocacia, de forma direta. Nas hipóteses em que o desbloqueio não é de bens em dinheiro, o advogado pode escolher entre a adjudicação do bem constrito - ou seja, a transferência da posse e propriedade do bem para o profissional do direito - ou a sua venda em hasta pública, consoante o §4º, do artigo 24-A. Nestes casos, o valor excedente será depositado em conta vinculada ao processo judicial. 

No entanto, a nova garantia em foco não abrange os bens que forem constritos em causas que envolvem crimes de tráfico de drogas (Lei nº 11.343/2006) ou exploração de trabalho escravo (art. 243, § único, Constituição Federal). Aqui, percebe-se que o intuito legislativo é impossibilitar que o advogado se associe com os ganhos ilícitos do seu cliente. 

Verifica-se que o legislador, ao inserir as disposições contidas no artigo 24-A, do Estatuto da Advocacia, busca, além dos objetivos já mencionados, assegurar o direito constitucional à defesa. A alteração legislativa permite que o titular da universalidade de bens bloqueados por decisão judicial possa assegurar sua representação por advogado, bem como prestigia a atuação do profissional do direito.

ALTERAÇÕES NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL:

A Lei 14.365/2022 alterou o Código de Processo Civil ao incluir os parágrafos 6º-A e 8º-A no Artigo 8510, referentes à fixação dos honorários sucumbenciais.

O §6º-A reforçou o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça sobre a inviabilidade da fixação de honorários por apreciação equitativa quando os valores do proveito econômico ou da condenação forem elevados. Nesses casos, aplicam-se os percentuais previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo. Conclui-se que o arbitramento de honorários por equidade é admitido apenas quando o proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou quando o valor da causa for muito baixo.

Já o §8º-A levantou o descabimento do aviltamento dos honorários advocatícios. Isto é, o referido parágrafo visa evitar que a apreciação equitativa prevista, nos termos do §8º, resulte em cifra inferior àquela que o advogado da causa teria por direito, nos limites estabelecidos pelo §2º11.

OS VETOS DO PRESIDENTE 

Os vetos abordados neste texto são os constantes no artigo 7º da Lei 14.365/202212 e se concentram, em sua maioria, em seu §6º, que trata do tema da busca e apreensão em escritório ou local de trabalho do advogado.

A regulamentação existente atualmente acerca do assunto se encontra no art. 7º, inciso II do Estatuto da advocacia, o qual determina ser direito do advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho. A quebra dessa inviolabilidade encontra sua fundamentação no §6º do mesmo artigo.

Os vetos do Presidente da República, acerca do tema inviolabilidade do escritório ou local de trabalho do advogado, foram os seguintes: 

"§ 6º-A. A medida judicial cautelar que importe na violação do escritório ou do local de trabalho do advogado será determinada em hipótese excepcional, desde que exista fundamento em indício, pelo órgão acusatório."

"§ 6º-B. É vedada a determinação da medida cautelar prevista no § 6º-A deste artigo se fundada exclusivamente em elementos produzidos em declarações do colaborador sem confirmação por outros meios de prova."

Acerca dos dispositivos supracitados, os vetos estão apoiados na justificativa de contrariarem o interesse público. O Presidente entendeu que a previsão que limita a violação do escritório ou local de trabalho do advogado à circunstâncias excepcionais impactaria o livre convencimento motivado dos magistrados, podendo, inclusive, afetar a atuação da polícia judiciária. Isso porque, para a análise da medida judicial aplicável, caberia ao Poder Judiciário a avaliação fundamentada do caso concreto, não sendo possível, pois, um deferimento feito com base em juízo abstrato.

Por sua vez, o § 6º-C do art. 7º, também vetado pelo Presidente, em seu teor, dispunha:

"§ 6º-C. O representante da OAB referido no § 6º deste artigo tem o direito a ser respeitado pelos agentes responsáveis pelo cumprimento do mandado de busca e apreensão, sob pena de abuso de autoridade, e o dever de zelar pelo fiel cumprimento do objeto da investigação, bem como de impedir que documentos, mídias e objetos não relacionados à investigação, especialmente de outros processos do mesmo cliente ou de outros clientes que não sejam pertinentes à persecução penal, sejam analisados, fotografados, filmados, retirados ou apreendidos do escritório de advocacia."

Neste caso, o veto se fundamentou na violação da constitucionalidade e do interesse público, tendo em vista que o dispositivo acima acabaria conferindo aos advogados atos típicos da atividade legislativa, pois permitiria a realização de juízo prévio quanto aos documentos que poderiam ou não ser apreendidos pela autoridade policial responsável.

A seu turno, o § 6º-F do art. 7º, também vetado pelo Presidente, tinha como redação:

"§ 6º-F. É garantido o direito de acompanhamento por representante da OAB e pelo profissional investigado durante a análise dos documentos e dos dispositivos de armazenamento de informação pertencentes a advogado, apreendidos ou interceptados, em todos seus atos, para assegurar o cumprimento do disposto no inciso II do caput deste artigo.”

O referido veto empregou o argumento de que a proposição legislativa contrariaria o interesse público, tendo em vista a impossibilidade de exigir o acompanhamento do investigado em todos os atos do processo. 

A exigência da presença do advogado investigado e representante da OAB em todos os atos poderia prejudicar a eficiência dos órgãos persecutórios na elucidação das infrações penais, e, com isso, favorecer o combate à criminalidade.

Ainda, há que se comentar os § 6º-G e § 6º-H do art. 7º, também vetados pelo Presidente:

"§ 6º-G. A autoridade responsável informará, com antecedência mínima de 24 (vinte e quatro) horas, à seccional da OAB a data, o horário e o local em que serão analisados os documentos e os equipamentos apreendidos, garantido o direito de acompanhamento, em todos os atos, pelo representante da OAB e pelo profissional investigado para assegurar o disposto no § 6º-C deste artigo."

"§ 6º-H. Em casos de urgência devidamente fundamentada pelo juiz, a análise dos documentos e dos equipamentos apreendidos poderá acontecer em prazo inferior a 24 (vinte e quatro) horas, garantido o direito de acompanhamento, em todos os atos, pelo representante da OAB e pelo profissional investigado para assegurar o disposto no § 6º-C deste artigo." 

O veto dessas disposições caminhou pelo mesmo argumento do § 6º-F do artigo 7º, de que a impossibilidade de exigir o acompanhamento do investigado em todos os atos do processo, contrariaria o interesse público. 


AUTORES

• ANALINE MENEZES BOCHENEK    • JULIA FERREIRA MAURER    • JULIANA OLIVEIRA ROLIM DE MOURA    • GABRIELA FONTANA DE MORAES    • GUSTAVO KROETZ DE OLIVEIRA    • LAURA CORDEIRO FLEISCHFRESSER    • LUISA CUNHA PEREIRA FILIZOLA    • MATHEUS LUIS PAVONI SILVA    • RODRIGO OTÁVIO DE MIRANDA SANTOS    • VITORIA DE SOUZA PONTES 

SUPERVISÃO

ANNA BEATRIZ LEÃO



[1] § 2º-B. Poderá o advogado realizar a sustentação oral no recurso interposto contra a decisão monocrática de relator que julgar o mérito ou não conhecer dos seguintes recursos ou ações:
I - recurso de apelação;
II - recurso ordinário;
III - recurso especial;
IV - recurso extraordinário;
V- embargos de divergência;
VI- ação rescisória, mandado de segurança, reclamação, habeas corpus e outras ações de competência originária. 
[2] A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal admite sustentação oral em agravo regimental, conforme registrado no Informativo nº 937, de abril de 2019.
[3] § 2º-A. Incluídos no plenário virtual o julgamento dos recursos e das ações originárias, sempre que a parte requerer a sustentação oral em tempo real ao julgamento, o processo será remetido para a sessão presencial ou telepresencial.
[4] sustentar oralmente, durante as sessões de julgamento, as razões de qualquer recurso ou processo presencial ou telepresencial em tempo real e concomitante ao julgamento.
[5] Texto dos vetos: Entretanto, a despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, pois vislumbra-se risco à celeridade no trâmite dos processos judiciais, uma vez que se opõe ao avanço recente de novas modalidades síncronas e assíncronas de prestação do serviço jurisdicional, que apresentaram incremento de eficiência, celeridade e digitalização do Poder Judiciário. 
[6] § 6º-I. É vedado ao advogado efetuar colaboração premiada contra quem seja ou tenha sido seu cliente, e a inobservância disso importará em processo disciplinar, que poderá culminar com a aplicação do disposto no inciso III do caputd o art. 35 desta Lei, sem prejuízo das penas previstas no art. 154 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). 
[7] Artigos 7o, inciso XIX e 34o incisos VII e IX
[8] § 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).         (Redação dada pela Lei nº 14.365, de 2022).
[9] “Art. 24-A. No caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa, ressalvadas as causas relacionadas aos crimes previstos na Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), e observado o disposto no parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal.
1º O pedido de desbloqueio de bens será feito em autos apartados, que permanecerão em sigilo, mediante a apresentação do respectivo contrato.
2º O desbloqueio de bens observará, preferencialmente, a ordem estabelecida no art. 835 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015(Código de Processo Civil).
3º Quando se tratar de dinheiro em espécie, de depósito ou de aplicação em instituição financeira, os valores serão transferidos diretamente para a conta do advogado ou do escritório de advocacia responsável pela defesa.
4º Nos demais casos, o advogado poderá optar pela adjudicação do próprio bem ou por sua venda em hasta pública para satisfação dos honorários devidos, nos termos do art. 879 e seguintes da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015(Código de Processo Civil).
5º O valor excedente deverá ser depositado em conta vinculada ao processo judicial.
[10] § 6º-A. Quando o valor da condenação ou do proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa for líquido ou liquidável, para fins de fixação dos honorários advocatícios, nos termos dos §§ 2º e 3º, é proibida a apreciação equitativa, salvo nas hipóteses expressamente previstas no § 8º deste artigo.
8º-A. Na hipótese do § 8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no § 2º deste artigo, aplicando-se o que for maior.
[11] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:I - o grau de zelo do profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
[12] Art. 7º São direitos do advogado: II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. § 6o  Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.   
 

 

Área relacionada: