Repercussão dos empréstimos realizados pelo empregador ao empregado e os descontos salariais

Maria Carolina Mattar Diaz
Atualmente, não há legislação trabalhista que proíba ou regule a realização de empréstimos entre empregadores e empregados. No entanto, a forma como os descontos são aplicados no salário do empregado podem gerar controvérsias trabalhistas e desafios jurídicos para as empresas.
Assim, para adotar tal prática e minimizar eventuais prejuízos, é necessário que a possibilidade de realização dos empréstimos esteja prevista em regulamento interno da empresa, acordo individual pactuado com o empregado ou com previsão em norma coletiva.
Quanto aos descontos, é importante destacar que um dos princípios mais importantes do Direito do Trabalho é o da intangibilidade salarial, que, entre outras coisas, proíbe a realização de descontos não autorizados no salário do empregado.
O artigo 462 da CLT proíbe o empregador de realizar qualquer desconto no salário dos empregados, no entanto, o próprio texto legal prevê exceções para tal regra, como em casos de adiantamentos salariais, descontos previstos em contrato coletivo, valores expressamente autorizados pelo trabalhador ou indicados em dispositivos de lei. Já o artigo 477 da CLT, que trata da rescisão do contrato de trabalho, em seu parágrafo quinto estabelece que qualquer compensação no pagamento não poderá exceder o equivalente a um mês de remuneração do empregado.
O Tribunal Superior do Trabalho também trata da possibilidade de descontos nas Súmulas 18 e 342. A Súmula 18 restringe a compensação de dívidas na Justiça do Trabalho apenas a créditos trabalhistas. Ou seja, não é possível a compensação de dívidas de natureza trabalhista com outras naturezas, tais como cível ou comercial. Por outro lado, a Súmula 342 permite descontos salariais previamente autorizados pelo empregado e destinados a benefícios como planos de assistência médica ou cooperativas.
A única previsão legal que pode ser utilizada por analogia aos empréstimos entre empregado e empregador é a Lei n. 10.820/2003 e suas alterações pela Lei n. 13.172/2015, que regula empréstimos consignados, financiamentos e operações financeiras realizados por instituições financeiras, no qual se permite o desconto diretamente do salário do empregado, desde que mediante autorização contratual e limitação de descontos.
Como não há legislação que regulamente especificamente a questão dos empréstimos entre empregadores e empregados e a possibilidade de realizar os descontos provenientes destes nos holerites dos empregados, acabam surgindo divergências sobre o tema.
No que diz respeito ao desconto do salário, as divergências são menores, já que o entendimento jurisprudencial pacificou grande parte dos conflitos, limitando o desconto a 70% do salário-base do empregado, devendo ser preservado um mínimo de 30% do salário, conforme prevê a OJ SDC 18 do TST e o artigo 82 da CLT.
Outra grande discussão diz respeito aos descontos nas verbas rescisórias. A doutrina e jurisprudência majoritárias entendem que o empréstimo pode ser descontado diretamente do salário do empregado, desde que haja autorização expressa e respeitados limites que garantam a subsistência do trabalhador, bem como a competência para dirimir os conflitos é da Justiça do Trabalho.
Entretanto, esses descontos não podem ser absolutos, pelo contrário, a jurisprudência tende a limitar os valores descontados da rescisão, especialmente em se tratando de empréstimos quando ocorre a rescisão contratual antes da quitação do débito pelo empregado.
Assim, diante dos riscos apresentados ante a divergência de posicionamentos e correntes mencionados anteriormente, as empresas devem adotar medidas para minimizar eventuais prejuízos trabalhistas.
Para isso, é importante a formalização do empréstimo e suas condições, com a assinatura da autorização expressa pelo empregado, a fim de que sejam realizados tais descontos.
Além disso, é necessário que seja realizado estudo da norma coletiva da categoria para que se verifique se o tema já foi abordado e, por fim, que as parcelas descontadas não comprometam mais do que 70% do salário do empregado.
Por fim, quanto ao desconto de verbas rescisórias, apesar de não ser um entendimento pacífico dos Tribunais, a posição mais segura é a de ater este desconto dentro do limite de um salário mensal, conforme o artigo 477, §5º da CLT, bem como respeitando o limite do valor das verbas rescisórias, previsto no artigo 1º, §1º da Lei n. 10.820/2003, aplicável por analogia ao empréstimo entre empregado e empregador.
Embora a concessão de empréstimos aos empregados seja uma prática benéfica, as empresas devem agir com cautela para evitar litígios trabalhistas. A falta de regulamentação clara sobre o tema reforça a importância de documentar o acordo e observar a jurisprudência predominante. Caso surjam questionamentos, a orientação jurídica especializada é essencial para mitigar riscos e garantir segurança jurídica nas relações de trabalho.
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