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A condenação da Uber e as novas relações de trabalho

Publicado em 03 Outubro 2023

A recente decisão da Justiça do Trabalho envolvendo a Uber e seus motoristas intensificou as discussões acerca das novas relações de trabalho na era digital. 

A sentença proferida em ação coletiva movida pelo Ministério Público do Trabalho, publicada na data de 14 de setembro, foi proferida pelo juiz Maurício Pereira Simões, da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo – SP, que reconheceu a existência do vínculo empregatício, condenando a empresa a contratar formalmente todos os motoristas ativos em sua plataforma, além de pagar uma multa no valor de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos.   

O magistrado considerou que a empresa sonegou direitos mínimos, deixou os motoristas sem proteção social, e “se omitiu” em relação à obrigação de cumprir a legislação.

Sobre tal decisão cabe recurso, e a plataforma Uber já sinalizou que irá recorrer e que entende tal decisão absurda.

A decisão é considerada surpreendente, pois reflete entendimento contrário à jurisprudência majoritária que vem sendo estabelecida pelos Tribunais Regionais do Trabalho, especialmente o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – São Paulo, no qual tramita o processo e, inclusive, pelo Tribunal Superior do Trabalho em algumas de suas turmas. 

 

O caso da Uber: empregado ou autônomo?

A controvérsia envolvendo a classificação dos motoristas da Uber como empregados ou autônomos subsiste desde que o aplicativo chegou ao país, em 2014. Desde então, observa-se na jurisprudência entendimentos distintos acerca dessa relação.

No Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não há uma decisão uniforme. Enquanto a 3ª e a 8ª Turma reconhecem a existência do vínculo empregatício, a 4ª e 5ª Turma rejeitam essa relação de emprego. Diante da divergência, o tema foi encaminhado para a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1), que buscará harmonizar e unificar a questão.

Em caso análogo de outra plataforma, o STF recentemente cassou a decisão do Tribunal Regional que havia reconhecido o vínculo empregatício entre a plataforma e o trabalhador, determinando a remessa à Justiça Comum e negando a competência da Justiça do Trabalho para dirimir o tema.

De acordo com o ministro Alexandre de Moraes, relator da referida ação, “o vínculo entre o motorista de aplicativo e a plataforma mais se assemelha à situação prevista na Lei 11.442/2007, que trata do transportador autônomo, proprietário de vínculo próprio, cuja relação é de natureza comercial. Portanto, as controvérsias sobre essas situações jurídicas devem ser analisadas pela Justiça Comum, e não pela Justiça do Trabalho”.

O modelo laboral da Uber não é debatido apenas no Brasil. Países como Estados Unidos, Reino Unido e França têm enfrentado questões similares sobre a classificação dos trabalhadores em plataformas digitais.

A discussão atual está cada vez mais focada na necessidade de adaptar a legislação trabalhista às novas realidades econômicas e evoluções tecnológicas, a fim de garantir não somente proteção aos trabalhadores de plataformas digitais, como também segurança às empresas de tecnologia.

 

Considerações finais

Sabe-se que o trabalho realizado pelos motoristas de aplicativo consiste em uma novidade propiciada pela tecnologia e pela economia do compartilhamento, e, portanto, não se enquadra nos modelos tradicionais de contrato de trabalho, especialmente o modelo rígido estabelecido pela legislação brasileira. 

Embora amplamente discutido na jurisprudência nacional, é fato que a legislação trabalhista atual não contempla disposições específicas que abordem a relação jurídica existente entre as plataformas digitais e os prestadores de serviço. 

A decisão da Justiça do Trabalho de São Paulo demonstra, mais uma vez, as incertezas e divergências que envolvem os novos modelos de relações de trabalho, e apenas reitera a necessidade de uma efetiva discussão e definição do futuro do trabalho e da economia moderna.

Portanto, mostra-se cada vez mais necessária uma legislação específica a respeito a fim de se evitar tal insegurança jurídica, como ocorre com os representantes comerciais, sob pena de empresas desse ramo acabarem optando por descontinuar seus serviços no Brasil, o que prejudicaria não só os prestadores de serviços de tais plataformas, como também os milhões de usuários que utilizam esse meio de locomoção em substituição ao transporte público.

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