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STF - Compensação de reserva legal – desafios práticos à CRA para caracterização da “identidade ecológica”

Publicado em 23 Abril 2024

A Ação Direta de Constitucionalidade n. 42, julgada em 2019, que definiu a constitucionalidade de determinados artigos do Código Florestal (Lei n. 12.612/12), recentemente foi objeto de elucidações em sede de Embargos de Declaração pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A compensação de reserva legal é prerrogativa instituída pelo Código Florestal que autoriza os detentores de propriedades rurais desprovidos de alocação de cobertura vegetal nativa por desmatamentos promovidos no passado a utilizarem áreas de outros imóveis rurais com excedente de reserva legal, uma vez que sejam atendidos determinados critérios legais. 

O STF conferiu interpretação ao art. 48, §2º do Código Florestal que trata da Cota de Reserva Ambiental (CRA), asseverando que podem ser transferidas de maneira onerosa ou gratuita, em regime de compensação de reserva legal, áreas que possuam “identidade ecológica”. 

A CRA é regulamentada pelo Decreto Federal 9.640/18 e trata-se de ativo ambiental que reflete a área com excedente de vegetação nativa de um imóvel em qualquer estágio de regeneração ou recomposição apta à compensação. Pode ser comercializada pelo respectivo detentor em consonância com a legislação estadual complementar, conforme seja aplicável, desde que o órgão ambiental competente (i) tenha aprovado o respectivo Cadastro Ambiental Rural (CAR) do imóvel; e (ii) tenha confirmado que a área de cobertura vegetal do imóvel está apta à compensação.

Porém, na prática, denota-se tarefa árdua aos players de possíveis operações envolvendo esse mecanismo de compensação, tendo em vista que o conceito de “identidade ecológica” possui nuances muito mais profundas que o conceito de “bioma”. Em virtude da dificuldade técnica na sua identificação, haverá necessidade de aprofundamento nas respectivas análises técnicas; tanto por parte dos órgãos ambientais ― para efeitos da respectiva conformidade e fiscalização ― quanto por parte dos proprietários rurais ― que necessitam conferir segurança à sua submissão para obtenção da respectiva homologação.

O termo “identidade ecológica” não possui definição específica por parte da lei, doutrina e/ou jurisprudência, tornando complexa sua definição em conexão com a avaliação do solo, clima, altitude, fauna, flora, níveis de precipitação, dentre outros aspectos. Esta análise mais detalhada implica maiores custos de transação à CRA, posto que sua interpretação técnica poderá inferir divergências entre órgãos ambientais estaduais, além de demandar, em alguns casos, consonância com regras de Programas de Regularização Ambiental.  

Mas vale mencionar que a definição de “identidade ecológica” é restrita à modalidade de compensação por meio da CRA referenciada no art. 66, §5º do Código Florestal. Os outros casos permissivos de compensação de reserva legal permanecem com o critério de localização no mesmo “bioma”, a saber: (i) arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou reserva legal; (ii) doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária; e (iii) cadastramento de outra área equivalente e excedente à reserva legal, em imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição. 

Enquanto a jurisprudência busca equacionar a preservação dos ecossistemas de acordo com as diretrizes legais, a aplicação prática enfrenta desafios técnicos e interpretativos a serem operados por agentes públicos ambientais e consultores contratados pelos proprietários rurais. 

Num cenário que aponta preocupações dos players do agronegócio com implementação de ações de enfrentamento às consequências da mudança climática, a deliberação judicial em matéria de natureza ambiental ainda suscita reflexões contínuas diante do desafio da harmonização da proteção ambiental às necessidades práticas da gestão fundiária.

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